quinta-feira, 30 de abril de 2015

5 ANOS DE A ENDOMETRIOSE E EU!! BODAS DE MADEIRA!!

Imagem da internet


Eu ando tão corrida e ocupada com a minha princesa que tive um lapso de memória. No mês de abril celebramos os 5 anos do A Endometriose e Eu. Ainda bem que ainda dá tempo de dar os parabéns a este meu lindo filhote. Obrigada a todos que fazem do blog o mais lido do mundo sobre endometriose. Já estamos chegando aos 7 mil acessos diários. Obrigada aos voluntários maravilhosos que Deus colocou em minha vida e que me ajudam a trazer informações exclusivas sobre a endometriose e que fazem o blog ser o mais completo do mundo sobre o assunto. Como passou rápido esses 5 anos. Parece que foi ontem que idealizei este meu bebê. Hoje estou com outro bebê e este aqui já está indo para a fase adulta, mesmo com a pouca idade. Que venha mais 5 anos, mais 10 anos, mais 15 anos. Vida longa ao A Endometriose e Eu. Obrigada a todos que acreditaram e que acreditam neste projeto social voltado às cerca de 200 milhões de portadoras ao redor do mundo, em especial, as mais de 7 milhões de brasileiras. Nossa grande missão de ter a endometriose não só conhecida, mas reconhecida e ter nossos direitos pelos nossos governantes está se concretizando. Já conseguimos uma lei de endometriose no Brasil, na cidade de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, e vamos conseguir mais. Considero o A Endometriose e Eu um filho, mas também um grande casamento. Portanto comemoramos a Bodas de Madeira! A união faz a força e juntos somos mais fortes! Beijo carinhoso! Caroline Salazar e equipe

quarta-feira, 29 de abril de 2015

5 ANOS DE BLOG! DAVID REDWINE: ENDOMETRIOSE DIAFRAGMÁTICA - SINTOMAS, DIAGNÓSTICO E COMO TRATAR!


Em mais uma tradução do médico e cientista americano, David Redwine, é de suma importância aqueles que querem entender as várias manifestações da endometriose. Infelizmente a doença pode atingir qualquer órgão do corpo feminino e hoje vamos saber mais sobre a endometriose diafragmática, seus sintomas e como tratar. Não podemos dizer que esse tipo de endometriose é raro, hoje não é mais, infelizmente, ela está cada vez mais comum. Beijo carinhoso! Caroline Salazar


Por doutor David Redwine 
Tradução: Alexandre Vaz
Edição: Caroline Salazar

Endometriose Diafragmática – Semelhante, mas diferente

Esse artigo foi escrito e publicado no início dos anos 1990. Na época, a excisão de doença diafragmática era feita rotineiramente via laparotomia (uma incisão grande, ao invés da cirurgia minimamente invasiva). Mais de 20 anos depois, contudo, as técnicas cirúrgicas evoluíram, e a doença diafragmática é hoje removida rotineiramente via laparoscopia e toracoscopia. 

A endometriose geralmente ocorre na pelve, mas em casos raros foi reportada em outras áreas do corpo. Já foram, inclusive, registados casos em homens. Mesmo se a endometriose existir longe da pelve, ela compartilha semelhanças com a doença pélvica. Quando a doença sintomática ocorre em outras áreas do corpo, o principal sinal de alarme é a dor.

Tal como a dor pélvica com endometriose, a dor pode estar presente por todo o mês e pode ser agravada pelo fluxo menstrual ou por movimento de estruturas próximas. Prestando atenção a essas semelhanças genéricas da endometriose, isso pode ajudar os clínicos a pensar no diagnóstico em diferentes locais do corpo, incluindo o diafragma.

O diafragma é um músculo bastante fino que parece uma tigela que usamos no café da manhã para comer cereais, mas virada de ponta cabeça. Ele separa a cavidade torácica da cavidade abdominal e tem a sua ligação no fundo das costelas. Existe uma metade esquerda e uma metade direita. A parte anterior da metade direita está escondida por trás do fígado.

O diafragma é abastecido pelo nervo frênico e é o músculo mais importante usado na respiração. Ele é de interesse principalmente para cirurgiões gerais, que são chamados a reparar estruturas do diafragma resultantes de trauma, ou para reparar hérnias hiatais, entre outros. Os ginecologistas têm noção do diafragma, mas como o diafragma não engravida, geralmente não prestam muita atenção nele.

Contudo, a endometriose pode ocasionalmente afetar o diafragma, então, os ginecologistas não podem ignorar completamente a sua existência. Durante a minha carreira vi uma série de pacientes com endometriose diafragmática espalhados pelo mundo inteiro.

Cada paciente tem uma história muito semelhante. Todas passaram por vários tratamentos conhecidos para endometriose pélvica, mas apenas uma tinha recebido um diagnóstico para endometriose diafragmática por laparoscopia. Existem vários motivos para isso.

A maioria dos ginecologistas não foi treinada para olhar para o abdômen superior durante uma laparoscopia pélvica. Afinal, ginecologistas não são treinados para fazer cirurgia no abdômen superior, então é compreensível que muitos não olhem para onde não conseguem tratar.

Adicionalmente, em muitas portadoras a dor pélvica começou muito antes da dor relacionada com a doença diafragmática, então, o cirurgião pode não ter motivos para suspeitar de algo no abdômen superior.
Cada paciente reporta um começo gradual (ao longo de vários meses ou anos) de dor no ombro direito associada com o fluxo menstrual. A dor era descrita como vinda de dentro do ombro e em parte irradiando para o lado direito do peito. A dor espalharia pela parte superior do braço direito e também um pouco pelo pescoço, como resultado de tensão muscular em resposta à dor.

Uma paciente descreveu a dor como sendo semelhante a dor profunda no peito que se sente quando corre bastante. Várias pacientes descreveram dificuldade em dormir em certas posições, sendo ocasionalmente acordadas pela dor.

Uma paciente não conseguia dormir deitada por conta de dor severa e descobriu que conseguia um alívio parcial dormindo sentada na poltrona com gelo aplicado no ombro. A maioria das pacientes eventualmente começaram a experimentar uma baixa da dor durante o mês. Outra paciente tinha recebido várias rondas de terapia medicamentosa dirigida à sua doença diafragmática, incluindo Danazol (indutor de menopausa) e um hormônio liberador de gonadotrofina.

Ela também tinha tentado fulguração via laparoscopia (nota do tradutor: processo em que é usada uma faísca elétrica para destruir o tecido que contém a lesão) no diafragma, mas mesmo assim a dor dela continuou. Nenhuma das outras tinha recebido diagnóstico ou tratamento para endometriose diafragmática.

Quando o doutor Sharpe e eu realizamos cirurgia nessas pacientes para a doença diafragmática, começamos com laparoscopia segundo o procedimento tradicional, fazendo a inserção no umbigo. Em todas as pacientes observamos pequenas lesões que poderiam ser endometriose na parte visível do lado direito do diafragma em frente ao fígado.

Contudo nós tínhamos suspeitas de que essas pequenas lesões não estavam causando todos esses sintomas, e para certificar, inserimos um segundo laparoscopo no lado direito da parte superior do abdômen, junto da parte inferior das costelas. Isso nos permitiu ver por trás do fígado. E lá estava. Cada paciente tinha uma área feia de doença invasiva, instalada bem atrás do fígado onde não tínhamos conseguido ver com o primeiro laparoscopo. (Ver as figuras 1 a 5 de endometriose superficial e invasiva no diafragma, e a cirurgia necessária para a sua remoção.)


Figura 1: Lesão superficial de endometriose diafragmática


Figura 2: Endometriose invasiva da parte posterior direita do diafragma (atrás do fígado)


Figura 3: Excisão da endometriose diafragmática invasiva durante laparotomia

Figura 4: O diafragma após excisão de endometriose com penetração completa
Figura 5: Os pontos de entrada para inspeção completa do diafragma (incluindo a porção posterior direita do diafragma, atrás do fígado). A paciente foi colocada em uma posição inversa a Trendelenburg bem inclinada (cabeça acima dos pés)
Na nossa primeira paciente, tentamos a resseção da área afetada através de laparoscopo, mas isso não funcionou de jeito nenhum. O fígado estava no caminho e não era possível chegar até aos focos. Mesmo que conseguíssemos ressecar essa área, iríamos nos deparar com um outro problema: em cada paciente a endometriose estava bem espalhada pelo diafragma. Então tínhamos de remover toda a espessura do diafragma e fazer a reparação laparoscopicamente. Isso demoraria uma eternidade, e existia risco de dano para o pulmão agora exposto.

Nós tivemos de abrir a primeira paciente para completar a cirurgia, e tivemos de abrir as outras quatro também. Com cirurgia aberta, o fígado pode ser afastado do caminho, uma porção do diafragma removido e depois reparado com segurança através de sutura. Todas as cinco pacientes obtiveram alívio da dor no ombro direito após a cirurgia, e nenhuma referiu qualquer dificuldade na respiração.

Raios-X pós-operatórios e fluoroscopia nas nossas duas primeiras pacientes estavam normais, e por esse motivo não nos sentimos impelidos a checar as seguintes. A nossa primeira paciente voltou alguns meses depois com endometriose diafragmática no lado esquerdo (estivemos tão focados com a natureza da dor do lado direito que não verificámos direito o lado esquerdo do diafragma).

Aprendemos várias coisas sobre a endometriose diafragmática com tudo isso.

1- Suspeitar de endometriose diafragmática com base na dor do lado direito ou esquerdo que poderá estar associada ao ciclo menstrual;

2 - Usar o laparoscopo para olhar ambos os lados do diafragma de forma tão completa quanto possível. Ainda que o cirurgião detecte uma lesão de endometriose que não se sinta capaz de remover nessa ocasião, pelo menos terá feito o diagnóstico;

3 - Se for detectada uma pequena lesão diafragmática, ela poderá ser uma lesão “sentinela”, e portanto, apenas a ponta do iceberg. A maioria da doença poderá estar escondida atrás do fígado e o diagnóstico correto requer um segundo laparoscopo inserido mais acima no abdômen;

4. Vaporização a laser ou eletrocoagulação de uma pequena porção visível poderá tratar apenas uma fração do foco. Já que a doença que parece ser sintomática sempre envolve a espessura completa do diafragma, seria necessário queimar até o outro lado através do diafragma com laser ou eletrocoagulação para tratar o foco totalmente. Isso implica risco aos pulmões e até ao coração, e o cirurgião ainda acaba com um buraco no diafragma que precisa ser fechado;

5. O laparoscopo é inadequado para tratar endometriose diafragmática. É necessário recorrer a laparotomia.

Atualização sobre endometriose diafragmática (Março de 2013)

O artigo acima foi escrito no início dos anos 1990. As coisas sofreram alguma evolução desde então, por isso, aqui está uma atualização sobre a gestão da endometriose diafragmática.

95% dos casos ocorrem no lado direito devido a padronização embrionária. Os sintomas mais comuns são dor no ombro e peito direitos, que pode irradiar para o pescoço e para a parte superior do braço. A dor começa a aparecer antes e durante a menstruação, mas em algumas portadoras ela pode envolver o mês inteiro, embora continue com um agravamento nos dias da menstruação.

Algumas pacientes precisam dormir sentadas e a respiração pode ser dolorosa quando a dor é mais intensa. Terapia medicamentosa geralmente falha – isso não constitui surpresa.

Quando a endometriose diafragmática é sintomática, ela sempre atravessou a espessura do diafragma na totalidade, o que não é difícil, pois a espessura é em torno de 1/8 de polegada (cerca de 3,2 milímetros).
Endometriose sintomática sempre é descoberta na margem posterior do diafragma, onde o fígado fica junto do diafragma. Essa é uma área que nem sempre pode ser observada com um laparoscopo inserido no umbigo, então fica fácil que passe despercebida.

Outra coisa que pode confundir o diagnóstico é o fato de algumas portadoras tendo doença invasiva no diafragma posterior poder ter pequenas lesões superficiais “sentinelas” na parte anterior do diafragma, que podem ser vistas pela entrada umbilical.

O cirurgião poderá pensar que isso representa a totalidade da doença, e pode até excisar essas pequenas áreas pensando que é tudo o que existe. Quando a portadora continua reportando dor, isso deixa todo mundo confuso. A melhor forma de ver a parte posterior do diafragma é inclinar a mesa operatória para que os pés fiquem para baixo (isso permite que o fígado caia um pouco, ficando afastado do diafragma o suficiente para que a parte traseira possa ser visualizada mais facilmente) e inserido um laparoscopo de 5mm no espaço intercostal do lado direito, para que possa passar por cima do fígado, permitindo a visualização da parte posterior do diafragma.

A resseção de endometriose diafragmática sintomática sempre exige resseção da espessura completa, o que pode ser feito através de laparotomia ou laparoscopia. O truque para operar laparoscopicamente é colocar a portadora na posição decúbito lateral esquerda (deitada sobre o lado esquerdo) já que isso permite que a gravidade afaste o fígado do diafragma.

A função diafragmática é normal na maioria das portadoras após cirurgia, embora ocasionalmente uma portadora possa ter função reduzida por alguns meses até que ocorra re-enervação. Essa função reduzida temporariamente é raramente notada pela paciente, e dado que elas estavam incapacitadas por uma das funções mais importantes do corpo humano, esse é com certeza um pequeno preço a pagar.

Os resultados da cirurgia são espetaculares – alívio completo dos sintomas em mais de 90% dos casos, parcial nos outros, e nenhuma falha. O alívio parcial pode estar relacionado com a formação de aderências entre o diafragma e o fígado, ou a áreas de penetração completa que ocorrem mais no canto do diafragma atrás do fígado.

Essa área é visível através do buraco no diafragma antes de ser suturado e a endometriose ser resseccionada através do buraco ao operar no tórax. Um pequeno dreno deve ser deixado para escoar fluídos que podem acumular durante o processo de cura, de contrário a paciente poderá ter um colapso parcial do pulmão devido a acumulação de fluido, e então terá de ser encaminhada para a radiologia, para que um radiologista instale um dreno.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

5 ANOS DE BLOG! VOU PARTICIPAR DO SIMPÓSIO DE ENDOMETRIOSE NO PARANÁ!





No próximo dia 6 de maio, quarta-feira, vou participar do Simpósio de Endometriose que será realizado pelo Conselho Regional de Medicina do Paraná. Por conta da minha baby, a minha participação na mesa de debates será de São Paulo, pela internet mesmo. Ainda bem que hoje a tecnologia é nossa aliada quando não podemos estar presente em algum evento. Qualquer pessoa interessada no assunto poderá assistir. Como assistir?

A sala é aberta uma hora antes do evento. Você deve se conectar no www.crmpr.org.br, a partir de uma hora antes, no canto superior esquerdo terá um banner com acesso on-line que explica o passo a passo para entrada na sala, pedimos a quem for se conectar que faça a inscrição para garantir a participação,  pois as vagas são limitadas. Inscrições presenciais e online no link: http://www.crmpr.org.br/Simposio+sobre+Endometriose+18+42833.shtml 
                    
Simpósio sobre Endometriose: 

20h |    Palestra: Endometriose
            Palestrante: Dr. Francisco Furtado Filho

21h |    Mesa Redonda
                        Moderadora:   Dra. Regina Celi Passagnolo Sergio Piazzetta – Conselheira e médica especialista

                        Debatedores:  Dr. Francisco Furtado Filho – Médico especialista
                                                       Dr. William Kondo – Médico especialista
                                                     Sra. Caroline Salazar – Jornalista e editora do blog “A Endometriose e Eu" - (participação será de São Paulo, pela web)

22h |    Encerramento


Publico alvo: Classe médica em geral, estudantes de medicina e Comunidade
Disponibilizaremos 300 vagas web, e 266 presenciais

Conto com a participação de todos. Beijo carinhoso! Caroline Salazar

domingo, 26 de abril de 2015

5 ANOS DE BLOG! "COM A PALAVRA, O ESPECIALISTA" DOUTOR HÉLIO SATO!!

Em "Com a Palavra, o Especialista", o doutor Hélio Sato fala sobre as dores nas pernas, a sensação de peso que muitas portadoras de endometriose têm. Essa é uma queixa corriqueira na maioria das portadoras. Eu sentia muitas, mas muitas dores nas pernas, até minha segunda e última cirurgia, a qual me livrou de todas as dores! A outra questão é da minha querida Gisele Dhal sobre a sarcoidose. Além de endometriose, ela descobriu esta outra doença crônica que também é terrível. Vamos mantê-la numa corrente de orações para que ela fique bem com o tratamento. Quem tiver dúvida sobre endo escreva para carolinesalazar7@gmail.com com o título  "Com a Palavra, o Especialista". Lembro que aqui não colocamos dúvidas individuais, mas sim as de interesse de muitas portadoras. Esta coluna não é e nem substitui uma consulta médica. Beijo carinhoso! Caroline Salazar

- Tenho endometriose e sinto muitas dores nas pernas. Sinto as penas pesadas, mas também uma dor que irradia da região do abdômen para as pernas. Cinthia S., São Paulo - SP

Doutor Hélio Sato:  Queixa nas pernas são muito comuns nas mulheres com endometriose. Seguramente, mais da metade das pacientes referem sintomas nas pernas, que podem ser variados desde a sensação de peso à dores intensas e frequentemente estão associadas com dor lombar baixa. As razões de dores nas pernas decorrem na imensa maioria da complexa inervação da pelve. Muito raramente, é devido a implantação de focos de endometriose nas pernas.

- Há relação entre endometriose e sarcoidose? Tenho endometriose de grau elevado e fui diagnosticada com sarcoidose. Gostaria também que o Dr explicasse o que é sarcoidoise e seus sintomas, para que mais pessoas entendam a doença. Gisele Dhal, São Paulo – SP

Doutor Hélio Sato:  Não há relação entre as duas doenças. A Sarcoidose é uma doença crônica multissistêmica que está associada com profusas lesões designadas por granulomas (não caseosos, pequenos nódulos inflamatórios) e inflamação. A causa da sarcoidose não está determinada, embora a doença possa ser reportada a uma bactéria ou infecção fúngica, ou a uma resposta autoimune a um antigênio indeterminado. O início da sarcoidose pode ser espontâneo ou gradual, e os pacientes podem ser assintomáticos ou exibir uma sintomatologia clinica variada.

A sarcoidose tem sido raras vezes identificada na região peritoneal. Consequentemente, a doença dificilmente seria incluída no diagnóstico diferencial de uma massa pélvica e ascite (uma acumulação de fluido na cavidade peritoneal), podendo resultar em um diagnóstico tardio e tratamento inapropriado. E, não associação populacional entre a sarcoidose e a endometriose. Os sintomas da sarcoidose variam muita da localização da doença, por exemplo, se ocorrer nos pulmões levará a dor torácica e falta de ar, nos olhos alterações visuais e assim por diante.


Sobre o doutor Hélio Sato: 


Ginecologista e obstetra, Hélio Sato é especializado e endometriose, em laparoscopia e em reprodução humana. Tem graduação em Medicina, Residência Médica, Preceptoria, Mestrado e Doutorado em Ginecologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), e foi corresponsável do Setor de Algia Pélvica e Endometriose da mesma instituição. 

Hélio Sato tem certificado em Laparoscopia pela Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e de Obstetrícia. É membro da AAGL “American Society of Gynecology Laparoscopy” e é coordenador de pesquisas da clínica de reprodução humana GERA e está à frente nas seguintes linhas de pesquisas: endometriose, biologia celular e molecular, cultura celular, polimorfismo gênico e reprodução humana. (Acesse o currículo Lattes do doutor Hélio Sato). 

quinta-feira, 23 de abril de 2015

5 ANOS DE BLOG! DAVID REDWINE: A ENDOMETRIOSE É UM AUTOTRANSPLANTE?

Por doutor David Redwine
Tradução: doutor Alysson Zanatta
Edição: Caroline Salazar

A endometriose é um autotransplante?

Resumo

Objetivo: a teoria de refluxo da menstruação de Sampson sugere que a endometriose é uma forma de uma condição conhecida como autotransplante. Este estudo busca caracterizar autotransplantes da forma como são discutidos na literatura médica e determinar se a endometriose se parece com um autotransplante.

Desenho do estudo: revisão da literatura dos estudos publicados que contêm os seguintes tipos de informação: (1) caracterização histológica, imuno-histoquímica, ou estrutural dos autotransplantes; e (2) comparações da endometriose com o endométrio eutópico.

Principais Medidas de Resultados: Foram anotadas as características de múltiplos autotransplantes. As similaridades ou não similaridades entre a endometriose e o endométrio foram tabuladas para um julgamento qualitativo se as evidências disponíveis suportam a teoria de que a endometriose é um autotransplante.

Resultado(s): os autotransplantes permanecem muito similares ou idênticos aos tecidos de origem, independente do tempo após o autotransplante. A endometriose difere em várias e profundas maneiras do endométrio, incluindo a clonalidade da origem, atividade enzimática, expressão proteica, e características histológicas e morfológicas. Uma pequena parte dos estudos encontrou semelhanças entre a endometriose e o endométrio.

Conclusões: endometriose é diferente de endométrio e, portanto, não tem as características de autotransplante. A teoria de Sampson de refluxo menstrual não é ratificada por este estudo. Estudos experimentais sobre endometriose que não tenham usado o endométrio menstrual podem levar a conclusões enganosas.

Introdução

A endometriose afeta aproximadamente 10% das mulheres em seus anos reprodutivos (1) e representa uma das doenças humanas mais comuns. A teoria mais aceita sobre sua origem (2) é a teoria de Sampson da menstruação retrógrada. A versão final da teoria de Sampson (3) propõe que a endometriose ocorre como resultado do refluxo do sangue menstrual através da porção fimbrial das trompas uterinas, este sangue carregando consigo células viáveis do revestimento endometrial que poderiam se aderir às superfícies peritoneais, proliferarem, invadirem, e se tornarem a doença conhecida como endometriose. Gerações de ginecologistas aprenderam que a endometriose é simplesmente o endométrio normal localizado fora do útero, que é idêntico ao endométrio normal e que responde normal e previsivelmente ao ciclo hormonal ovariano.

A endometriose representaria portanto um autotransplante, no qual um tecido é transplantado para localizações ectópicas em um mesmo organismo. A ideia de que a endometriose seja um autotransplante levanta a questão “Qual é a natureza dos autotransplantes?”. A literatura relevante sobre autotransplantes foi revisada para identificação da natureza dos autotransplantes. Os estudos que comparam a endometriose ao endométrio tópico foram revisados para ajudar a responder a importante questão “A endometriose é um autotransplante?”

Materiais e Métodos

Foi conduzida uma busca na base de dados científica MEDLINE em linguagem inglesa a partir de 1966 com palavras-chave como autoenxerto, autotransplante, endométrio + endometriose, histologia, teoria de Sampson, menstruação retrógrada, endometriose + enxerto, ou endometriose microscópica. Além disso, foram pesquisados resumos mensais e artigos relacionados sobre endometriose fornecidos por uma biblioteca médica desde 1988 até o presente. Finalmente, as referencias dos artigos pesquisados foram revisadas na busca por trabalhos adicionais relacionados.

Para este estudo, foram lidos mais de 200 trabalhos da literatura ginecológica e sobre autotransplante. Os trabalhos sobre autotransplante foram incluídos caso eles contivessem comparações funcionais, morfológicas, histológicas ou outras, entre o tecido autotransplantado e o tecido em localização nativa. A intenção era determinar o quanto o autotransplante se assemelha ao tecido eutópico de origem. Os trabalhos da literatura ginecológica foram incluídos se eles claramente identificassem um estudo comparativo entre a lesão de endometriose e o endométrio tópico de uma mesma paciente, ou do endométrio normal de um grupo controle. Tais estudos comparativos indicariam o quanto a endometriose se assemelha ao endométrio. Para essa revisão de literatura não foi buscada aprovação de comitê de ética.

Resultados

Qual é a natureza de um autotransplante?

Um autotransplante é um tecido transplantado de um local para outro local no mesmo organismo, devido a um processo patológico ou à uma intervenção cirúrgica. Autotransplantes não necessitam de imunossupressão para existirem. Apesar de poder haver uma presunção razoável de que os autotransplantes deveriam permanecer essencialmente iguais ao tecido eutópico, tais transplantes poderiam possivelmente ser afetados pela passagem do tempo, interrupção do aporte sanguíneo normal, indisponibilidade de precursores bioquímicos, infecção, ataque do sistema imune, ou fatores desconhecidos que poderiam alterar sua imuno-histoquímica ou mudá-los morfologica, histologica, ou bioquimicamente. Ou então, tal tecido poderia permanecer inalterado em sua nova localização, não afetado por nenhum dos fatores acima. Os autotransplantes existem na forma de doenças humanas, como tratamentos, e como modelos experimentais de endometriose.

... um autotransplante é um tecido transplantado de um local para outro local no mesmo organismo, devido a um processo patológico ou à uma intervenção cirúrgica...

Autotransplantes como doenças humanas

A síndrome do ovário remanescente (SOR) é uma complicação tardia de uma ooforectomia difícil [4] na presença de aderências periovarianas, na qual fragmentos do ovário ficam para trás e podem ser estimulados pelos hormônios pituitários. Apesar de não dispor de uma vascularização normal, os autotransplantes de SOR podem responder normalmente aos hormônios pituitários [5,6,7], retendo a habilidade de produzirem estradiol suficiente para inibir os sintomas da menopausa [8] e para formarem cistos funcionais que podem ser sintomáticos [9,10]. O exame microscópico do tecido causador da SOR revela estruturas ovarianas inteiramente normais, incluindo o corpo lúteo, cistos foliculares, e oócitos [11, 12, 13], que podem persistir em humanos por até 5 [11] a 10 anos [12].

Esplenose refere-se a partículas macroscópicas de tecido esplênico  que se aderem mais comumente a superfícies abdominais ou torácicas após uma ruptura traumática do baço.  A esplenose pélvica pode ser causa de dor pélvica, e pode ser confundida com endometriose [14, 15]. As características histológicas de tais autotransplantes esplênicos são normais, independente do local que ocorreu o autotransplante [16, 17, 18, 19, 20, 21, 22], que pode incluir a pelve [14, 15, 23, 24, 25, 26]. As características histológicas podem permanecer normais durante décadas após o autotransplante [16], apesar de variações ocasionais na macro-arquitetura terem sido descritas, incluindo trabéculas e polpa branca [27] pobremente desenvolvidas. A regeneração de tecido esplênico normal a partir de pequenos fragmentos esplênicos [28] pode ser responsável pela resposta normal imunobiológica anti-infecciosa que pode ser encontrada em alguns [29, 30] mas não todos [31] os pacientes com esplenose.

Autotransplantes como tratamentos

Autotransplantes terapêuticos dependem que o autotransplante retenha todas ou a maioria de suas características e funções intrínsecas. Autotransplantes externos como enxerto de pele, transplantes de cabelo, e substituição de dedos após uma amputação não serão discutidos, já que é intuitivamente claro que o autotransplante permanece idêntico ao tecido eutópico. Exemplos de autotransplantes internos  incluem transplantes de medula adrenal para o cérebro na doença de Parkinson, transplante de valva pulmonar para o tratamento de doença aórtica valvar, e transplante de fitas de tecido ovariano para o antebraço.

O autotransplante de células cromáfinas adrenais para o cérebro é realizado para o tratamento da doença de Parkinson avançada. Estudos imuno-histoquímicos de autópsia do tecido transplantado realizados 4 meses após a cirurgia mostram que as células transplantadas retêm a habilidade intrínseca de expressarem proteína ácida glial fibrilar, cromoganina A, e subunidades de neurofilamentos, apesar de não terem a capacidade de produzirem a enzima tirosina hidroxilase [32]. Os investigadores especulam que a falta de expressão de tirosina hidroxilase pode ser devida à interrupção do mecanismo parácrino regulador normal que existe na glândula adrenal intacta.

A substituição da valva aórtica por uma pulmonar autotransplantada é realizada desde 1967 para o tratamento de doença aórtica valvar severa [33]. O índice de sobrevivência é bom [34] e depende da manutenção da função e morfologia valvares normais, o que pode ser interpretado como evidência de características anatômicas e histológicas normais. Uma boa taxa de sobrevivência dos pacientes por até 26 anos é documentada após a cirurgia. Autotransplantes pulmonares retirados tardiamente mostraram uma notável preservação da viabilidade celular e da arquitetura tecidual, tanto macroscópica como histologicamente [35].

Fitas de córtex ovariano têm sido autotransplantadas no antebraço de mulheres que necessitam se submeter à radioterapia pélvica por câncer ou castração devido a aderências. Tais autotransplantes funcionam normalmente, apesar da ausência de um suprimento vascular [36], semelhante à SOR.

Endometriose experimental em animais como um modelo de doença por autotransplante

Autotransplantes experimentais, assim como transplantes xenólogos de humanos para camundongos, têm sido usados em modelos animais para o estudo da endometriose e de seu tratamento clínico e cirúrgico.  Esses autotransplantes são tipicamente feitos no camundongo pela obtenção de fragmentos picados de endométrio eutópico que são injetados intraperitonealmente, ou implantados cirurgicamente no retroperitôneo, em algum lugar da cavidade abdominal. Isso resulta em endometriose experimental, a qual é descrita como similar ao endométrio nativo com características histológicas normais e respostas hormonais normais [37]. A criação desses autotransplantes como modelos experimentais da endometriose é a manifestação mais forte da crença de que a endometriose é igual ao endométrio nativo. A endometriose experimental já foi induzida em humanos, primatas, coelhos, ratos e camundongos.

Em um modelo humano de endometriose experimental, o sangue menstrual foi injetado autologamente no tecido gorduroso subcutâneo de parede abdominal inferior em oito mulheres [38], resultando em achados típicos de glândula e estroma endometriais em uma mulher. A endometriose nessa paciente não foi caracterizada em detalhes. Em um relato de caso [39], foi descrita endometriose iatrogênica em uma mulher após um procedimento de Estes para infertilidade devido a trompas uterina obstruídas. No procedimento de Estes, remove-se uma parte da parede uterina, criando-se uma janela na qual o ovário é suturado para se permitir uma ovulação intrauterina. Essa janela não seria necessariamente considerada impermeável, e neste caso a endometriose foi observada ao redor da incisão uterina durante a reoperação, mas não no fundo de saco. Entretanto, não está claro neste estudo se um pequeno depósito observado em um dos ligamentos redondos havia sido percebido na primeira cirurgia.

Outros primatas além de humanos foram objetos de vários estudos de endometriose experimental. Notou-se que o endométrio autólogo enxertado na câmara anterior dos olhos de 41 macacos rhesus permaneceu viável caso uma vascularização fosse estabelecida em 24 horas. O endométrio ectópico respondeu normalmente aos hormônios endógenos e exógenos. Apesar da descamação deste endométrio ter sido observada milhares de vezes durante os 432 ciclos menstruais avaliados, o endométrio descamado nunca implantou-se em nenhuma outra localização dentro do olho.

A endometriose experimental induzida em macacos pela injeção de endométrio fragmentado no retroperitôneo abdominal demonstrou glândulas e estroma típicos, com nenhuma variação na altura das células colunares [41]. O endométrio nativo não menstrual autotransplantado sobreviveu por mais de 26 dias em seis dos 7 macacos rhesus [42] com glândulas e estroma típicos e epitélio glandular com altura consistente na comparação intralesional, apesar das glândulas terem variado de alguma forma em tamanho.

Dez macacos foram objetos de um famoso experimento [42] no qual o fundo uterino foi separado do colo, e o útero rodado 180 graus de modo que o topo do fundo uterino pudesse ser suturado ao colo ou vagina para manter o útero em sua nova posição, de cabeça para baixo. Isso permitiu que o sangue menstrual saísse diretamente para a porção média da cavidade abdominal, entrando em contato direto com as alças intestinais. Em reoperações periódicas ao longo de vários anos, cinco macacos desenvolveram aderências maciças entre o intestino e o coto do útero invertido, e endometriose foi encontrada nessas aderências e na fibrose. Apenas um desses macacos teve endometriose longe do sítio cirúrgico, e as características histológicas de uma lesão do peritônio da parede abdominal lateral direita foram interpretadas como normais, apesar de haver elementos glandulares de tamanho consistente e células colunares de altura consistente. Nenhum dos outros cinco macacos desenvolveu endometriose, e nenhuma endometriose foi descrita na porção mais dependente da pelve (fundo de saco de Douglas) de qualquer animal.

A endometriose experimental em coelhos criada pela implantação de fragmentos de tecido endometrial é histologicamente semelhante ao endométrio eutópico [43, 44, 45] com epitélio colunar glandular bem desenvolvido que mostra altura glandular consistente [46] e proteínas similares àquelas encontradas no endométrio eutópico [47]. Alguns ressaltaram que o uso de fragmentos teciduais relativamente grandes seria muito semelhante ao endométrio eutópico do coelho [48] ou ratos [49], apesar de ter sido ocasionalmente observado uma variabilidade nas características histológicas dos elementos glandulares da endometriose experimental de coelhos chinchila [50]. Por causa dessa dúvida e também porque os fragmentos teciduais não se assemelharam morfologicamente ao endométrio eutópico, suspensões com células endometriais dispersadas foram injetadas no peritônio de coelhos [48] e observou-se que essas produziram lesões com alterações glandulares características.

A endometriose experimental que é produzida em ratos ou pela sutura de endométrio nativo às superfícies peritoneais ou mesentério [51] ou pela sua inserção sob a cápsula renal permanece histologicamente normal quando comparada ao endométrio eutópico, além de manter sua habilidade de responder histologicamente normal aos níveis de estrogênio circulantes [53]. Em outro modelo com ratos, a endometriose experimentalmente induzida não diferiu histologicamente do endométrio nativo [54].

Os investigadores também induzem endometriose experimental em um modelo de enxerto xenólogo de camundongo mais comumente pela injeção de endométrio humano não menstrual dentro da cavidade peritoneal de camundongos severamente imunodeficientes (SID). A endometriose experimental em camundongos SID mantém as respostas histológicas, hormonais e funcionais específicas assim como as propriedades bioquímicas do endométrio nativo eutópico [55, 56]; entretanto, em um estudo, todos os transplantes reverteram para um padrão proliferativo independente do padrão original do ciclo dos enxertos, incluindo endométrio menstrual [57]. Lesões peritoneais de endometriose experimental foram visíveis a olho nu em tais camundongos SID em apenas alguns dias após a injeção [57, 58], com uma aparência histológica e características imuno-histoquímicas similares ao endométrio eutópico. Outros investigadores relataram dificuldades em enxergar tais pequenas lesões a não ser que fossem marcadas com corante fluorescente [59].

A partir das observações acima, parece que os autotransplantes em humanos ou animais tipicamente permanecem normais em estrutura, função, morfologia, histologia, e resposta hormonal. A continuidade da função normal desse tecido é um benefício frequente ao paciente no caso de autotransplantes terapêuticos. Os autotransplantes parecem não ser atacados em sua nova localização por qualquer fator local ou humoral detectado, nem parecem se transformar de maneira profunda. Os autotransplantes podem permanecer similares ou idênticos ao tecido eutópico por décadas.

... os autotransplantes em humanos ou animais tipicamente permanecem normais em estrutura, função, morfologia, histologia, e resposta hormonal ...

A endometriose é um autotransplante?

Se a endometriose é um autotransplante, seria de se esperar que ela fosse similar ou idêntica ao endométrio menstrual – ou ao menos ao endométrio eutópico – porque essa é a natureza de um autotransplante. Há muitos estudos comparando a endometriose com o endométrio da mesma paciente ou com o  endométrio de controles normais. Esses estudos compararam níveis de receptores hormonais, e a natureza histológica, morfológica, e biológica da endometriose em níveis crescentes de sofisticação. Esses estudos, que são muito numerosos para serem detalhados, são resumidos na Tabela 1 [60-107].

Tabela 1: Diferenças entre endometriose e endométrio eutópico em humanos


Característica comparação: primeiro autor (referência)
Endometriose
Endométrio
Ciclicidade de receptores de estrgênio; Gould [ 60 ]
Ausente
Presente
Estrogênio da fase secretora que se liga ao estroma; Gould [ 60 ]
Presente
Ausente
Receptores de hormônios sexuais; Tamaya [ 61 ], Janne [ 62 ], Bergqvist [ 63 ], Lessey [ 64 ], Nisolle [ 65], Bergqvist [ 66 ]
Baixa-variável
Normal
Receptores de hormônios sexuais; Jones [ 67 ]
Alto
Normal
Níveis de receptor hormonal pós-menopausa; Toki [ 68 ]
Superior
Baixar
Histologia cíclica normal; Metzger [ 69 ]
Ausente
Presente
Diferenciação cíclica; Metzger [ 69 ]
Ausente
Presente
Sincronicidade tecidual endometrial de acordo com a fase, específica por paciente; Metzger [ 69 ]
Variável
Específico por fase
Variação glandular ou estromal Intralesional; Redwine [ 70 ]
Presente
Ausente
Metaplasia Fibromuscular, doença profunda; Cullen [ 71 , 72 , 73 , 74 ], Sampson [ 75 ], Fallon [ 76], Nisolle [ 77 ]
Presente
Ausente
Morfologia cística; Sampson [ 78 ], Nezhat [ 79 ]
Possíveis no ovário
Ausente
Perda de heterozigozidade; Jiang [ 80 ], Jimbo [ 81 ]
Presente
Ausente
Expressão cíclica de tenascina; Harrington [ 82 ]
Ausente
Presente
Receptores de fibronectina; Beliard [ 83 ]
Presente
Ausente
Integrina alfa-3; Regidor [ 84 ]
Maior
Ausente
Integrina alfa-3; Rai [ 85 ]
Positivo
Negativo
Integrina alfa 6; Rai [ 85 ]
Negativo
Positivo
E-caderina, mRNAs alfa / beta-catenina; Fujimoto [ 86 ]
Anormal, baixo
Normal
Apoptose de endométrio eutópico; Gebel [ 87 ]
Menor
Normal
Apoptose em pacientes com endometriose; Dmowski [ 88 ]
Menor
Normal
Expressão de aromatase; Leyendecker [ 89 ], Kitawaki [ 90 ]
Presente
Ausente
Proliferação de células do estroma, devido à interleucina 6; Yoshioka [ 91 ]
Não inibida
Inibida
Secreção de Interleucina 6; Tseng [ 92 ]
Fortemente presente
Presente
Antagonista do receptor de interleucina 1 em glândulas; Sahakian [ 93 ]
Sempre ausente
Normalmente presente
Linfócitos granulados; Jones [ 94 ]
Ausente
Presente
Células T ativadas; Witz [ 95 ]
Maior
Normal
Expressão de intérferon gama; Klein [ 96 ]
Maior
Normal
17-OH esteróide desidrogenase; Zeitoun [ 97 ]
Ausente
Normal
Produção de gelatinase A; Wenzl [ 98 ]
Maior
Normal
Enzima proteolítica catepsina D; Bergqvist [ 99 ]
Maior
Normal
Matriz metaloproteinase 1 perimenstrual; Kokorine [ 100 ]
Presente
Ausente
Matriz metaloproteinase -7, invasão estimulada por proteína; Rodgers [ 101 ]
Presente
Ausente
Ativador de plasminogénio tipo uroquinase; Bruse [ 102 ]
Maior
Normal
Fator de crescimento endotelial vascular em lesões pretas; Donnez [ 103 ]
Reduzido
Normal
Transcriptos do gene CYP1A1; Starzinski-Powitz [ 104 ]
Elevados 8,7 vezes
Normal
Proteína-I de endometriose (ENDO-I); Piva [ 105 ]
Maior
Normal
Expressão de Bcl-2; Watanabe [ 106 ]
Não cíclico
Cíclico
Resposta de síntese proteica e DNA de células do estroma ao fator de crescimento endotelial; Mellor [ 107 ]
Maior
Grande aumento

            Relativamente poucos estudos encontraram semelhanças entre a endometriose e endométrio (Tabela 2). Alguns desses estudos avaliaram parâmetros muito sofisticados que podem atingir comparações além da endometriose com o endométrio, podendo estar simplesmente abordando a natureza essencial de todos os tecidos vivos. Com a minúcia e o foco das investigações laboratoriais de uma doença aumentando cada vez mais, os resultados podem não se aplicar a todo o espectro daquela doença devido a um viés de seleção.

Tabela 2: Semelhanças entre endometriose e endométrio eutópico em humanos

Característica comparação: primeiro autor (referência)
Endometriose
Endométrio
Fator de crescimento endotelial vascular em lesões vermelhas; Donnez [ 103 ]
Presente
Presente
Fatores de ativação relacionados com as dioxinas, genes-alvo; Bulun [ 108 ]
Presente
Presente
Colágeno tipo I, III, IV; Stovall [ 109 ]
Presente
Presente
Componentes do complemento vascular tecidual; D'Cruz [ 110 ]
Presente
Presente
Fatores de crescimento de fibroblastos ácidos e básicos; Ferriani [ 111 ]
Presente
Presente
Queratinas 5,7,8,14,18,19; Kruitwagen [ 113 ]
Presente
Presente
Expressão da molécula de adesão celular; Bridges [ 114 ]
Presente
Presente
Doença "microscópica" invisível com magnificação; Redwine [ 115 ]
Ausente
Ausente


Discussão:

Foi necessário um certo grau de precaução para a interpretação da literatura aqui revisada. Por exemplo, a literatura a respeito da SOR e da esplenose pode não estar completa caso uma possível população de casos “silenciosos” não tiver sido relatada. Os casos podem não ter sido diagnosticados devido a falta de sintomas, e as suas condições podem ter diferido profundamente daquelas do tecido eutópico. Tal população não diagnosticada poderia teoricamente diferir significativamente da impressão que surge dessa revisão de literatura sobre os autotransplantes como doenças. Entretanto, a existência de tal população é especulativa, e o peso das evidências disponíveis indicam que os autotransplantes como doenças permanecem largamente similares ou idênticos ao tecido eutópico.

Além disso, o endométrio menstrual não foi utilizado em grande parte dos estudos de endometriose experimental em animais, em parte porque muitas das espécies estudadas não têm um ciclo menstrual. Portanto, poderia ser argumentado que os estudos de endometriose experimental em animais que não utilizam endométrio menstrual são irrelevantes porque eles não reproduzem o suposto efeito causador da doença assumido como a causa em humanos: isto é, o endométrio menstrual refluindo pela porção final fimbriada das trompas uterinas e aderindo-se às superfícies peritoneais, proliferando, invadindo, e se transformando na doença conhecida como endometriose. Parece que ou os pesquisadores consideraram impertinente o uso do endométrio menstrual para o estudo da endometriose experimental, ou que muitos pesquisadores simplesmente não consideraram em nada a sua importância. Em qualquer das situações, a evidência apresentada parece ser a única evidência disponível e, portanto, deve ser aceitada pelo seu valor de face.

Dadas os percalços citados acima, a resposta à questão “A endometriose é um autotransplante”? poderia, argumentativamente, ser não. Um autotransplante é muito semelhante ou idêntico ao tecido em sua localização nativa e pode permanecer normal em estrutura e função por décadas. Ao contrário, há múltiplas, profundas diferenças entre a endometriose e o endométrio nativo. Os estudos que mostram similaridades entre ambos são uma minoria distinta. O balanço das evidências sugere que a endometriose não é simplesmente um endométrio fora do lugar como seria esperado em uma doença por autotransplante. Há apenas duas possíveis explicações para tal incongruência. Ou o endométrio nativo é profundamente danificado em algum lugar entre a sua origem eutópica e o eventual estabelecimento da doença, ou a endometriose não se origina do endométrio nativo em um primeiro momento, mas sim como uma proveniência distinta.

... o balanço das evidências sugere que a endometriose não é simplesmente um endométrio fora do lugar como seria esperado em uma doença por autotransplante. Há apenas duas possíveis explicações para tal incongruência. Ou o endométrio nativo é profundamente danificado em algum lugar entre a sua origem eutópica e o eventual estabelecimento da doença, ou a endometriose não se origina do endométrio nativo em um primeiro momento...

Quanto à primeira possibilidade de dano tecidual durante o trajeto à cavidade peritoneal, é teoricamente possível que a ação biológica da menstruação danifique o endométrio normal de várias maneiras (veja Tabela 1). Entretanto, é difícil de conceber que a simples descamação de um tecido que era uma vez normal seria causa para que fosse tão “anormal”, e tal fato é apenas uma especulação. Tais diferenças requerem uma explicação para sua origem. De fato, em estudos de endometriose experimental que utilizaram endométrio menstrual, o enxerto resultante foi caracterizado como normal [38, 57]. Portanto, a evidência disponível sugere que a menstruação não é o agente danificador.

Poderia o dano tecidual em rota ser causado por outro agente? Não há nenhum motivo para suspeitar que o endométrio normal ou menstrual poderia ser danificado durante a sua jornada retrógrada para se aderir à superfície pélvica, ou após a proliferação e a invasão supostamente ocorrerem. Parece não existir nenhum mecanismo plausível que explique porque tal dano tecidual ocorreria durante a passagem retrógrada dessas células. De fato, um braço moderno da teoria da menstruação retrógrada sustenta que mulheres destinadas a terem endometriose teriam sistemas imunes deficientes que não poderiam identificar ou se defenderem contra o endométrio refluído no primeiro momento [116, 117, 118]. Um tal sistema imune deficiente pouco provavelmente poderia danificar células endometriais e modificá-las de todas as maneiras já identificadas, mas é difícil identificar um sistema alternativo capaz de produzir tal dano.  Representariam uma grande convolução à teoria de Sampson tais danos profundos obrigatórios ao endométrio nativo por um suposto processo não identificado durante o trânsito pelas trompas de Falópio e com efeitos tóxicos resultantes de larga escala, e também teriam ramificações profundas para a embriotoxicidade.

...não há nenhum motivo para suspeitar que o endométrio normal ou menstrual poderia ser danificado durante a sua jornada retrógrada para se aderir à superfície pélvica, ou após a proliferação e a invasão supostamente ocorrerem...

A medicina baseada em evidências está ganhando importância, como deveria ser. Nós na era moderna temos vantagens intelectuais e científicas que resultaram na compilação das evidências científicas sobre a endometriose que não eram disponíveis às gerações anteriores de clínicos, pesquisadores, e proponentes das teorias de sua origem. Como nós usaremos essas evidências? Está claro que a endometriose não poder ser considerada simplesmente um endométrio fora do lugar. Esta ideia, categoricamente aceita como um dos pilares da teoria de Sampson sobre sua origem, deve ser descartada.

... está claro que a endometriose não poder ser considerada simplesmente um endométrio fora do lugar. Esta ideia, categoricamente aceita como um dos pilares da teoria de Sampson sobre sua origem, deve ser descartada...

Dadas as diferenças entre a endometriose e o endométrio, a continuidade da aceitação da teoria de Sampson para a origem da endometriose deve ser questionada. Os proponentes da teoria de Sampson observaram essas múltiplas e profundas diferenças, mas não as explicaram. A prova mais simples da teoria de Sampson seria providenciar uma abundante quantidade de microfotografias em humanos da adesão inicial do endométrio menstrual às superfícies peritoneais, com a demonstração adicional de proliferação e invasão secundárias. Isso ainda não foi feito, apesar da crença que a adesão, proliferação, e invasão ocorrem bilhões de vezes ao redor do mundo. Independente de quanto tempo o endométrio refluído permaneceria aderido ao peritônio antes da invasão, um número suficiente de biópsias foi obtido ao longo dos anos para que esse evento tivesse sido provado conclusivamente, assim como os eventos não provados de invasão peritoneal e proliferação retroperitoneal. Existe abundante evidência de microfotografias da endometriose estabelecida, mas nenhuma explicação satisfatória porque os eventos que a precedem não puderam ser fotografados em humanos. E agora a teoria de Sampson também tem que fornecer uma explicação porque o suposto autotransplante conhecido como endometriose difere tão profundamente do endométrio nativo e de outros autotransplantes. A nossa profissão e as mulheres não podem esperar muito mais tempo por essas respostas.

... a teoria de Sampson também tem que fornecer uma explicação porque o suposto autotransplante conhecido como endometriose difere tão profundamente do endométrio nativo e de outros autotransplantes. A nossa profissão e as mulheres não podem esperar muito mais tempo por essas respostas...

Nota do Tradutor: a teoria mais aceita para explicar a origem da endometriose é a da menstruação retrógrada (proposta por Albert Sampson em 1927), segundo a qual células da menstruação refluiriam pelas trompas uterinas e se implantariam nos órgãos da pelve, causando a doença. Há uma grande e crucial crítica à essa teoria: ela jamais foi provada cientificamente.

Neste artigo, destinado à classe médica, mas perfeitamente compreensível pela população geral, o Doutor David Redwine contesta a teoria da menstruação retrógrada com argumentos sólidos e científicos. O Dr. Redwine, parafraseando o histórico médico romano Claudius Galeno (170 d.c), diz que “devemos acreditar apenas no que pudermos comprovar experimentalmente”. E nem o Dr. Redwine ou qualquer outro cientista moderno pôde comprovar diretamente a teoria da menstruação retrógrada.

Para o seu questionamento, o argumento do Dr. Redwine é relativamente simples: se a endometriose fosse causada pela menstruação, ela seria um autotransplante. Ou seja, seria um tecido transplantado de uma parte do corpo (o útero)  à outra (órgãos da pelve). Porém, após uma extensa revisão de estudos relacionados ao tema, o Dr. Redwine não conseguiu encontrar semelhanças entre a endometriose e outros autotransplantes conhecidos.

Além disso, ele destaca que a maioria dos estudos não utilizou células de menstruação humana (o que se esperaria para provar a teoria da menstruação retrógrada), provavelmente por questões técnicas e éticas. Em um único estudo desse tipo realizado na década de 1950, os pesquisadores conseguiram “produzir” endometriose em apenas uma de oito mulheres após a injeção de sangue menstrual, ainda que essa endometriose  não tenha sido perfeitamente caracterizada. Nos dias de hoje, tal estudo seria considerado antiético.

Nós médicos e pesquisadores ainda não conseguimos produzir em laboratório a endometriose profunda, aquela que forma nódulos e que é constituída principalmente por músculo liso. A teoria de Sampson também não explica a endometriose em mulheres que nasceram sem útero (agenesia uterina), em crianças, e em fetos. Apesar disso, Dr. Redwine destaca que “gerações de ginecologistas” são ensinadas que a endometriose é causada pela menstruação. Sampson, um gênio à sua época com o grau de evidência que dispunha, produziu uma teoria que hoje é o maior atraso aos avanços no entendimento e tratamento da doença. Não por culpa sua, mas por nosso único e exclusivo costume de acreditarmos em tudo que nos falam, sem maiores questionamentos. Como diz o ditado, “uma mentira repetida várias vezes pode se tornar uma verdade”. Cabe a todos nós interromper essa mentira, ainda que demore outras gerações.


Sobre o doutor Alysson Zanatta:

Graduado e com residência médica pela Universidade Estadual de Londrina, doutor Alysson Zanatta tem especializações em uroginecologia e cirurgia vaginal pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), cirurgia laparoscópica pelo Hospital Pérola Byington de São Paulo e doutorado pela Universidade de São Paulo, USP. Suas principais áreas de atuação são a pesquisa e o tratamento da endometriose, com ênfase na cirurgia de remoção máxima da doença. Seus inter­esses são voltados para iniciativas que promovem a conscientização da população sobre a doença, como forma de tratar a doença adequadamente. É diretor da Clínica Pelvi Uroginecologia e Cirurgia Ginecológica em Brasília, no Distrito Federal, onde atende mulheres com endometriose, e Professor-adjunto de Ginecologia da Universidade de Brasília (UnB). (Acesse o currículo lattes do doutor Alysson Zanatta).