terça-feira, 30 de junho de 2015

MATTHEW ROSSER: DIÁRIO DE UM PESQUISADOR - O COMEÇO!!!



imagem cedida por Free Digital Photos


Desde quando inciamos a parceria entre o A Endometriose e Eu e o cientista inglês Matthew Rosser, sempre soube que seu futuro na endometriose seria promissor, já que ele é jovem e entrou na área de pesquisa da endo por conta de ver sua mãe e sua esposa sofrerem com a doença. Ou seja, ele faz por amor e não para aparecer, como muitos por aí. Leia a entrevista que ele conta como começou sua história com a endometriose. Neste texto Matthew conta o início de sua jornada como pesquisador. Beijo carinhoso! Caroline Salazar

Por Matthew Rosser
Tradução: Alexandre Vaz
Edição: Caroline Salazar

Diário de um pesquisador de endometriose – O começo

Como os leitores regulares saberão, após uma longa pausa, finalmente tive a chance de estudar para um doutorado em pesquisa sobre endometriose. A entrada nesse doutorado me manteve bem ocupado nesses últimos tempos, daí a falta de postagens regulares no blog. Por isso eu achei que seria bom manter um registro online do meu progresso como pesquisador de endometriose, já que esse é um assunto que estou certo, poucas serão as pessoas que já acessaram (embora possam existir bons motivos para isso).

Isso também irá me lembrar de atualizar o blog, e espero, esclarecer o processo de pesquisa da endometriose do começo até o final. Também irá dar uma percepção dos bastidores do mal afamado mundo da pesquisa científica e das suas 'atividades escandalosas' realizadas por nós estudantes. Ok, quando eu falo de mundo mal afamado e atividades escandalosas, na verdade estou me referindo a ambientes laboratoriais esterilizados e 'ficar olhando gráficos', mas isso não parece tão excitante.
Bom, continuando com o diário, sim, eu sou de novo um estudante a tempo integral, com 31 anos (nota do tradutor: agora ele já tem 32) pesando nas minhas costas como se fosse o pão de açúcar, sendo a minha idade evidente por demais quando comparada com os jovens estudantes que perambulam pelo campus, parecendo que acabaram de cortar o cordão umbilical. Mas para lá da minha aversão à nova geração com seus cortes de cabelo que estão na moda, estou definitivamente onde quero estar - pesquisando sobre endometriose. Eu sei que o termo 'pesquisando sobre endometriose' é horrivelmente vago, mas existem algumas razões que justificam o fato de eu não poder entrar em muitos detalhes no momento.

1.      Existem protocolos de confidencialidade que eu tenho de cumprir, ou serei sacrificado no altar dos deuses da ética da pesquisa.
2.     Pesquisa acadêmica é igual a fazer exame no liceu, sempre tem alguém colando de você. Então, por mais que eu quisesse botar a boca no mundo sobre os meus resultados experimentais, igual a um louco usando uma bata de laboratório, terei de ser paciente até que o trabalho seja concluído, e isso vai demorar uns 4 anos.

Ainda assim, em tudo é filme policial, existem coisas que eu posso revelar, ou isso seria um diário bem curto e chato (em oposicão ao longo e chato em que inevitavelmente irá se tornar). Para começar eu vou investigar o efeito de algumas drogas novas na endometriose, espero que não sejam hormonais, reduzindo assim a lista de efeitos secundários associados com as terapias médicas atuais. Se tiver chance, eu tenho algumas ideias para testes diagnósticos de sangue para endometriose, mas terei de esperar para ver o que acontece.

Durante o período que decorreu entre o começo e o agora, eu tenho escrito muita coisa, (poderia lamentar o trabalho de Sísifo que é cuidar da papelada), leitura e escrita. Todos os estudantes de doutorado, no começo do seu estudo, precisam escrever um 'relatório de literatura', um resumo da pesquisa existente sobre o assunto que irão estudar.
Na verdade eu gosto de escrever sobre endometriose, sendo esse blog a prova disso mesmo, então eu fiquei muito feliz com a possibilidade de poder escrever sobre o assunto e ainda ser pago para isso. Vários rascunhos e muitos dias depois com olheiras, tentando escolher as passagens relevantes de um livro com duas mil páginas depois, a minha revisão literária estava feita. Obrigado meu pai!

Agora a 'verdadeira ciência' poderia começar.

Para começar a 'verdadeira ciência', vou ter que aprender várias técnicas básicas das quais vou precisar durante o meu doutorado. Felizmente no meu grupo existe um outro aluno que já está aqui faz um ano e pode ajudar os restantes colegas (graças a Deus ele tem a paciência de um santo, o que será bem útil para todos os envolvidos).
Se eu quiser fazer alguns experimentos, vou precisar de algo com que experimentar, e dada a natureza da minha pesquisa, as células do endométrio são um bom ponto de partida.

Cultivar células de endometriose em laboratório é, então, a primeira coisa que eu preciso dominar, e para conseguir isso, eu precisaria conseguir células em algum lugar. Provavelmente seria considerado uma tremenda grosseria se eu chegasse para uma senhora na rua com um speculum e pedisse para ela me fornecer algum do seu endométrio.

Então, em vez disso, nós temos um acordo com um cirurgião de um hospital local para nos providenciar amostras de endométrio de pacientes que deram o seu aval antes de ser feita uma laparoscopia nelas, pelos mais variados motivos.

No outro dia nós recebemos um lote de várias amostras que não pareciam ser mais do que uma pasta sangrenta de tecido, mas após um período de 12 horas cuidadosamente processando-as, conseguimos células de endométrio crescendo felizes em seus frascos de plástico. Embora tenha demorado uma eternidade para fazer isso, essa foi a parte fácil.

A parte difícil é conseguir manter as células vivas, o que é chamado de cultura de células. Se eu tivesse de comparar a cultura de células a algo, eu diria que é semelhante a jardinagem - você tem que alimentar as células, garantir que elas crescem nas condições adequadas, transferir para caixinhas maiores quando a cultura cresce demasiado para o espaço onde estava antes, e cantar para elas (Ok, essa parte é opcional).

Algumas células, bem como algumas plantas, são fáceis de cuidar e não requerem muito esforço. Outras pelo contrário são como aquelas plantas extremamente raras que crescem apenas em pedacinhos de terreno muito específicos na floresta tropical, e morrem se você respirar em cima delas. Adivinha qual a categoria a que pertencem as células do endométrio humano?

Enquanto que o endométrio cresce fácil no útero (e para as mulheres com endometriose, fora dele também), cultivá-las em laboratório exige cuidados geralmente reservados a pandas bebês. Nem precisa falar que as células endometriais são muito delicadas e frequentemente morrem antes que a gente consiga matá-las com drogas. Uma das competências que é necessário adquirir rapidamente para manter as células é a 'técnica de esterilização'.  Sempre que lidamos com culturas de células, tudo tem que ser esterilizado. Não apenas o equipamento, mas até a forma como trabalhamos.  Por exemplo, você precisa trabalhar em um gabinete com atmosfera esterilizada, tem que pensar cada movimento que faz com as mãos igual um jogador de xadrez faz, e precisa limpar as mãos com álcool tantas vezes por dia que faria com que a pessoa mais obcecada pela higiene parecesse o personagem da novela Tieta, o Bafo de Bode.

Apesar de toda essa confusão de requisitos, acreditem em mim, ela é absolutamente necessária. Não tem coisa pior do que ficar cuidando de uma cultura de células por uma semana, para perder tudo por conta de uma infecção bacteriana.  Ainda assim, estou no começo e espero que nas próximas semanas irei aperfeiçoar a minha técnica de cultivo de células. Embora existam obstáculos que preciso ultrapassar, eu não poderia estar mais feliz com o que estou fazendo. E sendo isso o começo da minha pesquisa, qual tem sido a literatura? Aqui ficam alguns artigos grátis para quem tiver interesse em aprofundar o seu conhecimento.

Nota do tradutor: Lamentavelmente não existe tempo para traduzir esses links, como devem imaginar é bastante trabalho e muito dirigido a uma camada da população que trabalhando nisso profissionalmente, dominará decerto a língua inglesa.

A Case of Multisystem Endometriosis
Whilst endometriosis outside the pelvic cavity is considered rare, there are still cases that come up with a degree of regularity; this is a case report of a woman with endometriosis near the lungs

Extrapelvic Endometriosis: A Rare Entity or Underdiagnosed Condition?
Continuing along the lines of endometriosis outside the uterus, here is a short review of different locations endometriosis

Endometriosis and Physical Exercises: A Systematic Review
This review summarises what little information there is on the effect of exercise on endometriosis symptoms


segunda-feira, 29 de junho de 2015

A HISTÓRIA DA LEITORA SABRINA PERTERMANN E SUA GRAVIDEZ GEMELAR - PARTE 2!!

 Sabrina com Guilhermo e Cecília

Em 2012 contamos no A Endometriose e Eu a incrível história de superação da leitora catarinense Sabrina Petermann e sua endometriose severa. De todas as histórias a de Sabrina foi uma das mais devastadoras que já contamos aqui. Além de perder alguns órgãos, ela teve de fazer até plástica em sua vagina de tantos focos que ela tinha. Hoje contamos a segunda parte de sua história que a coroou com a chegada dos gêmeos Cecília e Guilhermo em sua primeira tentativa de fertilização in vitro (FIV). Mais uma história para se inspirar e nunca perder a fé!. Beijo carinhoso! Caroline Salazar


“Após a alta do tratamento da endometriose (com zoladex e volta da menstruação) em março de 2012 foi a consulta de alta e meu médico disse que estava tudo bem agora. Nas consultas anteriores ele já havia me orientando que eu teria que engravidar naquele ano e que eu teria um ano para engravidar o que ele chamou de “janela fértil”. Enfatizou que caso eu tivesse interesse em ser mãe era “agora”. Sentindo a minha insegurança quanto à decisão, ele me disse uma frase que eu jamais esquecerei: “Como ginecologista eu digo que toda mulher ‘merece’ ser mãe”. Porém, eu estava insegura e assustada com a velocidade de tudo. Fiquei com um monte de “achismos” na cabeça. Eu achava que não era “uma pessoa” para fazer tratamento para engravidar. Eu achava que só faziam tratamento para engravidar pessoas que queriam muuuuito ser mãe. Eu queria, sim, claro que queria, mas achava que se não certo naturalmente eu adotaria e pronto. Estava resolvida esta questão.

Aliás quando eu estava internada em recuperação no hospital após  minha longa cirurgia, eu recebi a visita de uma senhora que estava acompanhando o marido em mais uma internação. Quando entrou no meu quarto ela disse: “Oi, sou assistente social aposentada, soube da tua cirurgia, do teu caso... da dificuldade que terás para ser mãe e eu quero te falar sobre adoção, te dar dicas de como fazer para o processo de adoção ser mais rápido e também te contar sobre a minha experiência como mãe de coração de 3”. Para mim isso era um sinal! Eu não poderia gerar, mas eu teria que adotar. Imediatamente pensei que Deus estava colocando aquela mulher no meu caminho para eu ver que eu poderia sim ser mãe de coração e que existem crianças à espera de uma mãe, de uma família (não só bebês). Que existe muito amor envolvido em adotar uma criança especial (com qualquer tipo de limitação) e etc. Eu tinha muito isso na minha cabeça e não queria nem tentar o tratamento de reprodução assistida.

Então, nessa consulta de “alta” eu disse: “Doutor não tem como tentar natural?” A resposta foi: “Três meses é o prazo que eu te dou. E se em 3 meses você não engravidar podes ir direto para clínica de fertilidade”. Voltei para casa empolgada. Passado o primeiro mês passou fiz um teste de gravidez de farmácia que deu negativo e logo veio a menstruação e pensei: “Por Deus, quem engravida em 3 meses? Só quem não quer engravidar”. E comecei a pesquisar os tratamentos, os valores. E já achei que aquilo tudo não era para mim, que eu não era “merecedora” de tal investimento financeiro, pois não sou “rica” para fazer tal tratamento e que eu não era “mãe” o suficiente para ser mãe. Enfim, eu achava que aquilo tudo não era para mim não. Eu pensava: “Pessoas ricas se tratam, pessoas pobres adotam e simples assim!”

Mas fui à clínica sozinha, sem o marido e recebi todas as informações sobre valores e voltei para casa. Isso tudo em uma consulta com o médico.

Ao chegar em casa mostrei um folder ao marido e expliquei tudo e disse: isso não é para gente. Tratamento é coisa de rico e nós não somos ricos, devemos adotar uma criança com mais de 3 anos, porque bebês todo mundo quer, e crianças com mais de 3 anos são poucos que querem. Nós vamos fazer isso.

E meu marido disse: “Eu quero tentar, eu acho que podemos tentar uma vez e se não der certo daremos um tempo, alguns anos para amadurecer melhor essa ideia de adoção. Eu não me sinto preparado para ser pai a ponto de adotar uma criança, pois isso é muito sério.

Voltei ao médico novamente sem o marido. E disse que queria tentar a inseminação artificial porque eu não tinha tanta vontade assim de ser mãe. Ele deve ter me achado uma ET. Primeiro porque todo mundo que vai lá vai de casal e eu ia sozinha e segundo porque parecia que eu estava quase fazendo o tratamento obrigada. E o que ele atende? Casais que super desejam serem pais.

 Sabrina com os bebês ainda no hospital

Ele calmamente me explicou que meu caso era problema feminino de infertilidade, para esses casos a indicação é a FIV. A inseminação é para casos de infertilidade masculina, e mesmo assim, em muitos desses casos ele indica a FIV, pois a chance de sucesso é maior. Voltei para casa transtornada pelo valor e por tudo.

Tudo era totalmente contra meu pensamento desde sempre. Eu achava que fazendo a FIV eu estaria “comprando” meu filho e que a natureza foi sábia em fazer mães que não podem gerar justamente para adotar os filhos daquelas mães que abandonam os seus. Na minha cabeça isso era simples assim.

Fui procurar formas de fazer o tratamento mais em conta. Passei tardes inteiras na internet pesquisando, já estava obcecada com isso. Os hospitais e as clínicas que faziam gratuitos como forma de estudo eram todas em São Paulo ou em outros estados e tinham filas de dois anos ou mais de espera e eu não tinha esse tempo a esperar.

Então, eu descobri o ProBEM (Programa que ajuda casais que tem doença crônica e problemas de concepção), que não é de graça, não é um super desconto, mas é uma ajuda, e qualquer ajuda estava valendo a pena. 

E fomos em frente. Começamos o tratamento na segunda semana de julho de 2012, exatamente no dia 16.  Eram injeções diárias de hormônios e eu me lembro de muitas mulheres ficando grávidas a minha volta e eu pensava: “O meu vai dar errado, porque para tantas mulheres grávidas, alguém tem que perder o bebê e essa serei eu...”.

O tratamento em si consome muito da gente, principalmente, do nosso emocional. E eu não tinha muitas esperanças mesmo, não sei porque me sentia assim já que sempre fui uma pessoa superpositiva e animada. Sou o tipo de pessoa topa tudo e sou super de bem com a vida, inclusive, meu cirurgião creditava minha recuperação rápida da cirurgia de endometriose a isso e sempre me elogiava por isso e ele sempre contava às outras pacientes dessa minha “força interior” como ele mesmo dizia.

Eu e meu marido optamos por não contar para absolutamente ninguém sobre o nosso tratamento!  Ninguém sabia, mães, pais, amigos ninguém! E eu realmente não tinha ninguém para dividir minhas angústias além dele. Isso pesou muito, muito mesmo. Por isso procurei uma psicóloga. Foram três encontros que me fizeram chorar muito e a questionar todos os meus valores e a mãe que eu gostaria de ser para o meu filho. Depois desses três encontros eu não pude mais ir por falta de tempo mesmo, já que o tratamento estava chegando ao fim e precisava de mais dedicação.

A família completa: Sabrina com os filhos e o marido

As consultas semanais passaram a ser duas vezes na semana. Eu ia até uma cidade vizinha e pegava muuuito trânsito, perdia toda a tarde e ainda parte da noite para fazer ultrassons transvaginais e acompanhar o desenvolvimento dos óvulos. Isso tudo é sim muito invasivo não só fisicamente, mas emocionalmente e muito cansativo também. Além de toda a expectativa gerada, claro.

Enfim chegou o dia da retirada dos óvulos e fui com meu esposo às 5h da manhã para o hospital. Apesar de ter apenas um ovário saudável já que um deles foi praticamente todo retirado na cirurgia de endometriose, foram produzidos 16 óvulos, os quais 13 tinham condições de ir para laboratório. E, após algumas intercorrências, sobraram três para fecundação. Após fecundados, os três geraram dois embriões classificados como A e um embrião B.

Os embriões A foram implantados e o B decidimos doar para pesquisa, já que eu não tinha condições emocionais para uma nova FIV. Mesmo se não desse certo, essa seria a primeira e a última, pois eu não tinha mais forças.

Me informaram que o dia da implantação poderia ser qualquer dia, pediram para eu aguardar o médico me ligar. E assim num sábado à tarde o telefone tocou e do nada sai correndo pra lá.

Maneira louca de se conceber filhos não?

Bom, após o procedimento de implantação - estavam presentes na sala eu, o médico, a enfermeira e a bióloga - saí da clínica confiante e crente que eu teria a minha menina, a minha Cecília.

Devo dizer que a transferência foi até agradável. O médico e a enfermeira são suuuper queridos e dão muito apoio. Eles nos acolhem mesmo e a enfermeira um anjo. Durante todo o procedimento ela ficou segurando minha mão, fazendo carinho, me acalmando e falando palavras de incentivo...

Entrei nos dias de repouso pós-implantação. Fiquei em casa de férias vendo tevê, descansando e surtando. Eu tinha medo de ir ao banheiro fazer xixi e perder o bebê, acredita! Loucura total!

E todas as grávidas que falei acima, que encontrei no começo do processo na clínica, foram perdendo seus bebês uma a uma. Exatamente todas. E eu desesperada com tudo aquilo. Das que me lembro, até hoje só uma conseguiu ter filho depois de muitas tentativas.

Eu tive o sangramento de nidação no D9 e foi desesperador. Liguei para meu marido e para o médico chorando. Sangrei por uma tarde inteira e fiz o teste de sangue no dia seguinte...

Ao final do dia sai o resultado e adivinha: DEU POSITIVO. Segundo o médico não deveria dar positivo deveria dar um aumento nos hormônios somente.

Por telefone, após receber o exame por email o médico me disse que eu estava muito grávida, gravidíssima e eu questionei: “O que isso quer dizer?” E ele disse: “Que podem ser dois, mas não acredite ainda nisso tudo pode mudar”.

Isso era dia 28 de agosto de 2012 e jamais irei esquecer esse dia. Eu e meu marido comemoramos a notícia com um jantar a dois. Mesmo com tudo isso eu não acreditava na possibilidade de serem dois.

Eu tinha o primeiro ultrassom marcado, para ver se o tratamento tinha dado certo, no dia 18 de setembro e ele foi antecipado para o dia 17, fizeram às pressas em um encaixe após eu ter sangrado uma madrugada inteira.

Foi uma noite terrível, fiquei sem dormir e ia ao banheiro ininterruptamente e saia muito sangue.

Eu fui ao consultório segura apesar de tudo, crente que eu tinha perdido apenas um dos embriões. Meu marido estava transtornado e achava que tínhamos perdido tudo. E a cara do médico também não era das melhores. Ele também achava que estava tudo perdido, pois me disse: “Olha Sabrina tudo pode ter acontecido vamos lá ver”.

Esse ultrassom foi diferente de todos os outros mil que eu fiz durante o tratamento. Tudo mesmo, inclusive, a tevê que nos outros estava sempre virada para mim, neste não.

Desde o início ele tomou o cuidado de virar a tevê de modo que eu não visualizasse nada. Meu marido ficou no consultório ao lado da sala de exame, não foi chamado a acompanhar e eu só pensei: “Claro o que ele vai mostrar para mim?”

Os minutos pareciam não passar, pareciam horas, mas de repente ele chama meu marido, sem me dizer nada. Suspirei aliviada e logo pensei: “Deu certo, se não desse certo ele não chamaria meu esposo. Afinal chamar para mostrar o quê? Ele diria, pode se vestir e vamos ao consultório”.

Assim que meu marido se juntou a nós ele virou a tela e disse muito sorridente: “Deu muito certo!” E eu disse: “O que quer dizer muito certo doutor?”
E ele: “São dois! São gêmeos! Parabéns mamãe!”

Eu dei um pulo na maca e disse: “Como assim doutor?” Eu preciso só de um! Qual a chance de os dois irem adiante?” Ele respondeu: “Eu diria que 99%, pois estão bem implantados, bom batimento cardíaco para o período. Eles estão ótimos!

Assim eu entrei no consultório pensando ser uma paciente de tratamento mal sucedido e saí mãe de gemelares!!!! Repetindo abobadamente são dois! São dois! Dá para acreditar?

Sai grávida de gêmeos e com indicação de repouso nos três primeiros meses, pois todo aquele sangramento que tive significava um "descolamento embrionário". As chances da gravidez ir em frente eram grandes, sim, mas eu tinha que fazer o dever de casa que era: ficar na cama nos primeiros 15 dias e tomar remédios para "segurar" a gravidez.

Foram ultrassons semanais nesses três meses seguintes. O crescimento dos embriões faria com que eles se "colassem" nas paredes do útero e ficassem seguros. Foi um sucesso! E no dia que completei 13 semanas de gestação fiz um ultrassom com um médico super renomado que eu estava esperando desde o dia do positivo de laboratório. E mais do que rápido ele confirmou aquilo que meu instinto de mãe já esperava : era um casal!!! Ninguém achava que era um casal. Poucas pessoas opinavam. Meu marido achava que eram duas meninas, minha mãe e minha sogra que eram dois meninos e eu tinha até medo da minha certeza de ser um casal.

Após esse dia confirmado que estava tudo ok, pude sair do repouso. E sabendo ser um casal a gravidez transcorreu supertranquila mesmo. Foi tudo muito rápido, mágico e gratificante! Uma conquista mesmo! Sentir os dois mexendo na minha barriga foi um presente de Deus que eu jamais esquecerei! 

Eles nasceram prematuros de 34 semanas, e nessa ultima semana eu me senti muito cansada, a barriga pesava e eu chorei de cansaço mesmo! Eu não aguentava mais e implorava a Deus: "Meu Deus não aguento mais", isso durante toda a minha gravidez. Nesse dia eu já estava em trabalho de parto e não sabia. No dia seguinte eles nascerem. 

Eles nasceram às 11h30 do dia 24 de março de 2013 um domingo, justamente o dia que seria o meu chá de bebê. 

Fui "mãezinha de UTI" por 20 dias, uma experiência marcante, dolorosa, que muda a gente! Você aprende a dar valor ao mínimo! A tudo! A viver a vida um dia de cada vez. E a gente sai da UTI, mas a UTI não sai da gente! Marca profundamente pela vida toda. Eu carreguei meus filhos no colo cinco dias depois de eles nascerem. Ali eu pude beijar, cheirar, e, literalmente, lamber a cria.

Em casa cuidei deles sozinha eu e marido, sem babás, sem empregadas. Tinha uma faxineira por duas manhãs na semana, minha mãe por uma hora em todas as manhas (ela chegava às 8h me ajudava a colocar os dois no peito para a primeira mamada, dava a mamadeira de complemento para um deles e ia embora). No período da tarde minha sogra me ajudava de segunda à sexta. Ela passava as roupas deles e ajudava nas mamadas. Isso até aos 4 meses. As madrugadas sempre foram minhas e do marido e depois só minhas. A tia do meu marido de 70 anos, que é minha vizinha de porta, me socorre desde sempre. É uma vozona para eles. 

Eu lavava todas as roupas, arrumava a casa e cuidava deles. Era extremamente cansativo! Devido ao baixo peso de nascimento, as mamadas eram em horários e não em livre demanda e era preciso acordá-los durante as madrugadas duas vezes para mamarem. Eu parecia um zumbi!

Mas nada nesse mundo paga os momentos que vivi junto com cada um deles, mamando no peito nas madrugadas. Sem barulho, sem interferências. Só a gente! Com a maternidade eu mudei completamente a minha vida com a chegada deles.

Optei por ser só mãe nos dois primeiros anos de vida deles. Meu marido e eu cortamos muita coisa financeiramente. Passamos a ter um novo estilo de vida. Mas não me arrependo. 

Hoje a Cecília e o Guilhermo estão com 2 anos e 3 meses e frequentam uma escolinha municipal todas as manhãs desde fevereiro deste ano. Como eu sempre quis, os dois primeiros anos de vida deles foram em casa com a mamãe!  Agora ficamos as tardes em casa juntos. Ainda não voltei a trabalhar. E eu resumo a maternidade na minha vida com uma frase que li na internet: "E de repente a vida te vira do avesso e você descobre que o avesso é seu lado certo". 

Hoje sou mais humana, menos fútil, mais direta e objetiva do que nunca. Não tenho mais tempo a perder com coisas e pessoas que não acrescentam, sou mãe e tenho dois cidadãos para formar. Nunca desistam de seus sonhos! Estou aqui para, mais uma vez, dizer a todas endomulheres que continuem persistentes, com fé. Sou a prova de que tudo é possível. Beijo carinhoso, Sabrina".


quarta-feira, 24 de junho de 2015

MATTHEW ROSSER: O QUE AS BACTÉRIAS TÊM A VER COM A ENDOMETRIOSE?


Após as raras formas da endometriose, tanto em mulheres quanto em homens, e da doença encontrada de forma espontânea em macacos, no último texto da trilogia o cientista inglês Matthew Rosser aborda as bactérias e os micro-organismos, como a E. coli, e a endometriose. O que as bactérias têm a ver com a doença? Leia o texto abaixo com atenção. Boa leitura! Beijo carinhoso! Caroline Salazar

Por Matthew Rosser 
Tradução: Alexandre Vaz
Edição: Caroline Salazar

A endometriose é uma doença complexa, existem ainda diversas questões a serem respondidas em torno da sua origem, dentre elas, quem será portadora e porquê? Tudo isso junto faz com que estudar a endometriose seja como explorar o mundo no século 17. Existe uma noção de território a ser explorado, mas em vez de grandes naus de madeira e nativos para serem subjugados, temos teorias e hipóteses para testar por meio da ciência.

Algumas dessas teorias mostraram valerem o esforço de serem exploradas, algumas têm algumas, outras muitas e outras ainda nenhumas evidências que as suportam. Criar novas teorias por vezes parece igual a agitar águas lamacentas, complicando mais ainda um assunto já complicado por natureza, mas é apenas formulando novas ideias e testando-as que chegamos mais perto da verdade (contudo, todas as ideias devem ser testáveis e todos os testes devem ser sérios, objetivos e escrutinados pelos nossos pares, algo em que a pseudociência sempre falha).

Com isso em mente eu vou fazer um pouco de teorização neste post. Uma grande parte da minha pesquisa é examinar o papel que a inflamação desempenha na endometriose, especificamente o que controla a inflamação nos tecidos endometrióticos e endometrial. Parte dessa pesquisa envolve olhar as causas iniciais da inflamação, e uma coisa em particular chamou a minha atenção recentemente, uma bactéria.

Alguns tipos de bactéria são essenciais para nossa saúde, sem elas ficaríamos bastante doentes e vários dos nossos órgãos têm as suas próprias populações de micro-organismos que ajudam a realizar as suas funções corretamente. O intestino e a vagina são dois bons exemplos. O intestino, em particular, contém entre 500 a 1000 espécies diferentes de bactérias, somando trilhões de micro-organismos individuais.

Bem interessante é o fato de que as bactérias benéficas que naturalmente populam a vagina na verdade ajudam a prevenir infecções causadas por outras bactérias que causam doenças. Mas, por vezes, um desiquilíbrio da ordem natural da nossa microflora pode conduzir a condições mais graves.

Eu não estou caindo na armadilha de confundir endometriose com endometrite (nota do tradutor: processo inflamatório da mucosa uterina provocado por uma infecção bacteriana e por causas mecânicas, tóxicas e ou circulatórias) e certamente não estou sugerindo que endometriose é uma infecção ou é causada por uma infecção. Mas as bactérias podem desempenhar um papel até aqui desconhecido na inflamação e na geração de sintomas dolorosos na endometriose.

Como podem as bactérias contribuir para a endometriose? Para clarificar, estou falando de um tipo específico de bactéria chamada Gram-negativa, em cujo grupo se inclui a E. coli, uma das mais conhecidas espécies de bactéria.

O porquê de esses organismos serem importantes é devido a algo que eles segregam, nomeadamente de  lipopolissacarídeo (LPS). LPS são essencialmente toxinas que a bactéria produz e que são responsáveis por fazer com que você fique doente, mas eles são também poderosos estimulantes para inflamação e esse é o ponto chave.

Para começar precisamos saber quais as bactérias que estão normalmente presentes no útero e como isso difere na mulher com endometriose. Um estudo publicado em 2014 investigou esse fenômeno e descobriu que vários tipos de bactérias, especialmente, a E. coli, estão aumentados no endométrio da mulher com endometriose (ver gráfico abaixo)

As colunas brancas apresentam os níveis de micro-organismos encontrados no endométrio de mulheres sem endometriose, as colunas sombreadas representam os níveis nas portadoras.

O que podemos observar neste gráfico é que existem vários tipos de micro-organismos encontrados em níveis mais elevados no endométrio das mulheres, em particular, o E.coli. No seguimento dos seguintes estudos, verifica-se que a LPS foi descoberta em concentração muito mais elevada nos fluidos menstrual e peritoneal de portadoras, como se pode observar se clicar neste link, e olhar para as figuras C e D (as colunas brancas representam os níveis de LPS em não-portadoras e as pretas correspondem nas portadoras).

O acréscimo na LPS no fluído menstrual pode ser atribuído ao aumento de E.coli no endométrio, mas e no fluído peritoneal? Isso poderia ser explicado pela menstruação retrógrada, em que o fluido menstrual sobe pelas trompas de falópio e sai pela cavidade peritoneal.

A menstruação retrógrada é uma ocorrência natural no corpo da mulher, verificando-se em até 90% das mulheres e durante muito tempo pensou-se ser essa a causa da endometriose, com as células do endométrio descamadas durante o período sendo passadas para a cavidade peritoneal onde se implementariam e cresceriam.

Essa teoria caiu em descrédito à medida que mais provas são acumuladas, e que demonstram não ser essa a causa da endometriose, mas pode existir um papel para a menstruação retrógrada na endometriose, mas talvez não aquela que se pensava anteriormente.

Parece, então, plausível que os níveis aumentados de E.coli no endométrio conduzam a maiores concentrações de LPS no sangue menstrual, que pode sofrer refluxo para a cavidade peritoneal através da menstruação retrógrada, aumentando a concentração de LPS no fluido peritoneal, o que pode ter relação próxima/direta com as lesões de endometriose.

Alguns estudos observaram que LPS pode estimular células de endometriose a libertar fatores como prostaglandina E2 (PGE2) e fator de necrose tumoral (TNFα) que promovem inflamação e estimulam impulsos de dor (PGE2 tem sido implicada em um número de importantes fatores para a sobrevivência da endometriose, incluindo o aumento das células, inibição da destruição das células e produção de hormônios).


Isso iria conduzir a um estado inflamatório aumentado em torno das lesões de endometriose e no endométrio normal, possivelmente contribuindo para os sintomas frequentemente associados à endometriose, tais como, dor pélvica crônica e períodos excessivamente dolorosos. O processo pode ser resumido no diagrama abaixo.




1.      Aumento de E.coli no interior do útero causado por mecanismo desconhecido
2.     E.coli segrega LPS
3.      Menstruação retrógrada causa refluxo de LPS para a cavidade pélvica
4.     LPS estimula a endometriose para libertar fatores inflamatórios
5.      Inflamação em torno da endometriose causa dor e cicatrizes

A questão final, para a qual ainda não temos resposta, é porque motivo a E.coli e outros micro-organismos estão aumentados no endométrio das portadoras? Poderá dever-se à alteração na acidez vaginal, levando a uma mais fácil colonização do útero por bactérias, ou disfunção das células imunitárias no útero das portadoras, resultando em uma falha de manter esses micro-organismos controlados?

Para além disso, qual seria o efeito de restabelecer o equilíbrio desses micro-organismos e como seria possível fazê-lo? Existem muitas perguntas que necessitam de respostas, mas esperamos que essa seja uma área de investigação que trará resultados positivos no que diz respeito ao alívio dos sintomas relacionados à dor.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

MATTHEW ROSSER: ENDOMETRIOSE ESPONTÂNEA EM MACACOS? MAIS SOBRE A ORIGEM DA TEORIA DA DOENÇA!!

Após o primeiro artigo da trilogia do cientista inglês Matthew Rosser, que aborda a endometriose em homens, vamos ao segundo da série que vai desvendar mais um pouco desta doença que muitos dizem ser enigmática. Aos poucos, e com a ajuda de nossos parceiros internacionais, vamos mostrando como surge a endometriose. No texto, a taxativa de "a doença da mulher moderna" cai por água abaixo. Já falamos inúmeras vezes por isso no blog (Endometriose, a doença da mulher moderna? - texto 1 e texto 2). Uma de nossas intenções é ajudar você, querido leitor, a entender melhor como ocorre a endometriose. Boa leitura! Beijo carinhoso! Caroline Salazar


Por Matthew Rosser
Tradução: Alexandre Vaz
Edição: Caroline Salazar


Em cada ano, o mês da conscientização da endometriose parece estar maior. Eu recomendaria que fizessem uma pesquisa por #endometriosis se tiverem conta no Twitter para se manterem atualizados sobre as notícias e eventos que ocorrem no mundo inteiro. 

Neste artigo vou apresentar algumas ideias que rolam por aí acerca da origem da endometriose. Não na forma como essa doença tem origem no corpo (poderia escrever um livro inteiro sobre isso), mas onde e como a endometriose surgiu na história da humanidade.

Algumas pessoas tendem a pensar na endometriose como uma doença “moderna”, contudo existem vários recursos excelentes onde é examinada a história da endometriose por autores como Dr. Nezhat ou o Dr. Redwine, que sugerem que a endometriose existe há milhares de anos, porém, ela era camuflada por outros nomes. Hoje vamos olhar ainda mais atrás, para o começo de tudo.

Firmando esse pensamento, vamos começar do início, que é sempre um bom ponto de partida. Para encontrar a origem da endometriose, pesquisei quais os animais que poderiam desenvolver endometriose espontaneamente (existem inúmeros animais os quais podem ser induzida a “endometriose experimental”, mas eu estou apenas interessado naqueles onde a doença pode ocorrer naturalmente). Tendo realizado uma pesquisa exaustiva pela literatura,  descobri que a endo foi documentada nos seguintes animais:

Humano                                  Macaca Mulata
Gorilla                                       Macaco Cinomolgo
Babuíno-anúbis                     Macaco da Tailândia 
Babuíno amarelo                  Macaco Pigtail 
Babuíno sagrado                   Macaco do Pântano
Babuíno da Guiné                  Macaco Verde Africano
Babuíno cara de cachorro  Macaco do Velho Mundo
Mandril                                      Sagui-de-tufo-branco

Uma coisa que você poderá notar de imediato, é que todas as espécies referidas são primatas. A endometriose nunca foi documentada como tendo ocorrido em nenhuma outra espécie não-primata (existe uma doença no gado chamada de endometriose, mas eu não a levarei em conta, pois ela se refere à degeneração do endométrio, não sendo a mesma coisa que a endometriose real).

Isso indica que existe algo que esses animais possuem em comum, não partilhado por outros animais, que permite que eles desenvolvam endometriose. Dado que a maioria dos casos em primatas foram descobertos acidentalmente, ou na realização de autópsias nesses animais, é altamente provável que existem outras espécies de primatas nas quais a endo ainda esteja por ser descoberta (chimpazés, nosso parente mais próximo, estão estranhamente ausentes da lista, por exemplo).

O que podemos fazer com toda essa informação? Para responder, vamos olhar como as referidas espécies estão relacionadas entre elas. Sabemos, de 150 anos de biologia evolucionária, que todas as criaturas vivas na Terra estão relacionadas com as outras em uma complexa e fantástica árvore da vida, da qual somos apenas um pequeno galhinho.



Fazendo um zoom na parte que contém os primatas, podemos ver a nossa relação com os animais mais próximos de nós.


Acredite ou não, essa é uma versão simplificada da árvore da família dos primatas. Existem inúmeras espécies que foram deixadas de lado por já estarem extintas e omitindo várias espécies agrupei outras para manter tão simples quanto possível, mantendo ao mesmo tempo a informação importante. Agora se ligarmos todas as espécies nas quais descobrimos endometriose, podemos observar algo bem interessante.


As linhas vermelhas ligam todas as espécies em que foi documentada endometriose até hoje, e isso nos mostra a história natural da endometriose. A seta no fundo mostra o ponto em que, pelas evidências que temos, é credível que tenha sido a origem da endometriose.

Qualquer que seja o animal que tenha vivido nesse ponto, ele passou a sua predisposição para endometriose aos seus parentes. O que essa predisposição foi ainda não está claro. Ela deve ser genética, mas saber ao certo que gene ou genes são responsáveis não sabemos.

A principal razão para isso é que ainda não existe um consenso sobre quais os genes que estão associados à endo em humanos, quanto mais em outras espécies. O que quer que seja, mudou algo, talvez na forma como o sistema reprodutivo se desenvolveu, talvez na forma como os órgãos reprodutivos funcionam, no momento não sabemos dizer.

Se assumirmos que a endometriose surgiu nesse ponto, poderemos agora teorizar sobre quando foi que a endometriose surgiu, ao descobrir onde essas espécies que tiveram a doença viveram. Olhando onde todas as linhas vermelhas convergem, podemos ver que é no ponto em que o grupo de primatas contendo os marmosets (chamados de primatas do novo mundo) separaram do grupo de primatas contendo os humanos, chimpanzés, macacos, etc (chamados de primatas do velho mundo).

Pensa-se que o parente comum a esses grupos viveu no norte de África, perto do Egito, pois é onde a maior quantidade de fósseis foi descoberta. A análise da idade desses fósseis indica que terão entre 33 e 35 milhões de anos.

Contudo, usando análise genética para datar a separação entre as espécies baseado na proximidade de parentesco, coloca a data em cerca de 43 milhões de anos. Dessa evidência podemos teorizar por tentativa que a endometriose poderá ter dezenas de milhões de anos; mais antiga do que os registros da humanidade, mais antiga do que a própria humanidade.

Nós tendemos a pensar na endometriose em termos de história humana, e porque não deveríamos fazê-lo? A endometriose nos afeta aqui e agora, mas se considerarmos o nosso passado, ele poderá conter pistas para as respostas que estamos procurando.

Por exemplo, se soubermos quais os animais que podem desenvolver endo, e quais não podem, então, talvez, possamos entender o motivo. O que tem esses animais que os torna diferentes? Ao responder a essa questão, poderíamos enfim entender o que predispõe um indivíduo à endometriose e talvez como travá-la.